A absolvição de Renan e os moralistas do alheio

Duas postagens, uma no Blog do Nassif e outra no Blog do Noblat, resumem a votação do processo de cassação do senador Renan Calheiros. Na ordem:

1. A elegia da hipocrisia
Enviada por Helena Chagas

Defensores do voto aberto votaram contra fim do secreto.

Quem te viu, quem te vê. Quem viu no início da sessão a animadíssima defesa dos senadores hoje do fim do voto secreto até acredita. Alguns chegam a prever para amanhã o início de uma campanha retumbante nesse sentido. Mas, no dia 13 de março de 2003, quando a Casa derrotou emenda constitucional do senador Tião Viana acabando com o voto secreto para cassações, muita gente boa que discursa hoje para abrir o voto ficou contra.

Arthur Virgílio, por exemplo, que hoje fez veemente defesa do voto aberto no início do julgamento, dizia na ocasião: "O voto secreto é um instrumento que deixa o parlamentar a sós com sua consciência em uma hora que é sublime, em que o voto é livre de quaisquer pressões, que podem ser familiares, do poder econômico, de expressão militar ou de setores do Executivo. Voto pela manutenção do voto secreto".

E assim também fizeram, na ocasião, seus colegas Cesar Borges (DEM), Tasso Jereissati (PSDB), Eduardo Azeredo (PSDB), Heráclito Fortes (DEM), Garibaldi Alves (PMDB), Gerson Camata (PMDB), Agripino Maia (DEM), Edison Lobão (DEM), Marco Maciel (DEM), José Sarney (PMDB), Mão Santa (PMDB) e Leomar Quintanilha (PMDB), entre outros.

Ou seja, muda a platéia, muda o voto.

2. Renan intimidou senadores

- Senadora Heloísa Helena. A senhora sonegou o pagamento de impostos em Alagoas. Deve mais de R$ 1 milhão. Tenho um documento aqui que prova isso. E nem por isso eu o usei contra a senhora - disparou Renan Calheiros ao se defender da tribuna do Senado pouco antes de ser absolvido pela maioria dos seus pares.

- É mentira, mentira - gritou a presidente do PSOL sentada no meio do plenário. Pouco antes, ela subira à tribuna para atuar como advogada de acusação.

Renan não deu bola para a reação de Heloísa. Em seguida, virou-se para Jefferson Perez (PDT-AM) e comentou:

- Veja bem, senador Jefferson Perez. Eu poderia ter contratado a Mônica [Veloso, ex-amante dele] como funcionária do meu gabinete. Mas não o fiz.

Perez nada disse. Ouviu calado.

Então foi a vez do senador Pedro Simon (PMDB-RS). Renan disse olhando diretamente para ele:

- A Mônica Veloso tem uma produtora. Eu poderia ter contratado a produtora dela para fazer um filmete e pendurar a conta na Secretaria de Comunicação do Senado. Eu não fiz isso.

Simon ouviu calado.

Registre-se que o clima de intimidação dos senadores começou a ser criado logo no início da sessão quando discursou o senador Francisco Dornelles (PP-RJ). Ele foi o primeiro a falar.

Duas pérolas produzidas por Dornellles:

- Crime tributário não é causa para quebra de decoro.

- Amanhã, isso pode ser usado contra os senhores. Porque muitos aqui têm problemas fiscais.

Dornelles foi secretário da Receita Federal no governo de João Figueiredo, o último general-residente da ditadura de 1964. E depois foi ministro da Fazenda do governo José Sarney. [E também, como bem lembrou o Alexandre, do Blog do Alê, ministro do Trabalho de Fernando Henrique Cardoso]

No Jornal Nacional, foi curioso assistir a um diretor da OAB atacando o corporativismo do Congresso. Como se advogados, promotores, juízes não vivessem livrando a cara uns dos outros.

Um representante da CNBB também criticou a decisão, mas nada falou sofre os escândalos de pedofilia na Igreja Católica, acobertados pela cúpula da Igreja, tendo o cardeal Ratzinger (atual Papa Bento XVI) à frente da tropa de choque. Procurem pelo vídeo da BBC sobre o tema, aqui ao lado na caixa de vídeos do blog.

O que houve é que dessa vez o vício não prestou sua homenagem à virtude, embora a hipocrisia continue reinante.

Estou esperando a Veja - primeira a exigir transparência e a atacar todo mundo - gritar exigindo a criação da CPI da TVA, para provar que a transação é limpa e cristalina.

Mas aí a Veja, que defende CPI pra tudo, comporta-se como os senadores hipócritas da postagem de Helena Chagas no Blog do Nassif, e mais o advogado e o religioso do Jornal Nacional, que adoram criticar a casa do vizinho mas não põem uma única peça de roupa das suas para quarar ao sol da realidade.

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