Alô, Folha, 'lobo em pele de cordeiro' não é a Dilma, é o médico da tortura Amílcar Lobo, codinome Dr. Carneiro

Em sua reporcagem deste último domingo, que comentamos aqui, a Folha deu a palavra a um agente da ditadura, para que ele traçasse um perfil de nossa futura presidente, Dilma Rousseff. O agente, condenado na democracia por um IPM por desvio de tijolos, disse que Dilma é "um lobo em pele de cordeiro".

Mas o verdadeiro lobo em pele de cordeiro durante a "ditabranda" do Otavinho, foi o médico Amílcar Lobo, que usava o codinome Dr. Cordeiro. Freud explica, não? Pois no caso desse Lobo, Freud complica, porque ele, além de médico, fazia extensão em psicanálise. E qual o trabalho dele na ditadura? A jornalista Lúcia Romeu apresenta:

Naquele momento, Inês [Inês Etienne Romeu, irmã da jornalista, e que foi torturada, seviciada e estuprada na "ditabranda"] já sabia, por conversas anteriores com outros presos políticos, a verdadeira identidade do médico que a atendera no cativeiro com o codinome de Carneiro: o psicanalista Amílcar Lobo. Assim, dois dias depois da denúncia da casa, fomos – Inês, o então deputado federal Modesto da Silveira, o fotógrafo A. Fontes e eu – de surpresa ao seu consultório no sofisticado bairro de Ipanema, na Zona Sul do Rio. O Carneiro era o Lobo. Frente a frente com Inês, em tenso diálogo, ele confirmou que fora convocado a ir ao "aparelho" de Petrópolis como tenente-médico do Exército. Com um gravador escondido, registrei toda a conversa para IstoÉ. Perguntei-lhe se sabia que lá era uma casa onde se torturavam presos, e Lobo aquiesceu com a cabeça.

A psicóloga Cecília Maria Bouças Coimbra, presidente do Tortura Nunca Mais - RJ, acrescenta (leia o pdf aqui):

Era um médico psicanalista chamado Amílcar Lobo - ele era médico e fazia formação em psicanálise na Sociedade Psicanalítica do Rio de Janeiro. A história dele é muito interessante. Ele atendeu a mim e a outras pessoas, principalmente mulheres.


Quando fui presa, em 24 de agosto de 1970, fiquei dois dias no DOPS e depois fui levada para o DOI CODI. E a primeira pessoa que vi no DOI-CODI foi o Amílcar Lobo. Ele era tenente na época e acompanhava as torturas. Ele entrou na minha cela, perguntou se eu era cardíaca, tirou minha pressão. Logo depois, eu fui levada para a tortura e ele acompanhou. Ele, inclusive, aplicou eletrochoques, como os de hospital psiquiátrico, em uma amiga minha que já morreu, a Abigail Paranhos. Os choques que davam na gente não eram eletrochoque, eram choques na boca, nos seios, na vagina. Mas, na Abigail, ele deu eletrochoque, pois disse que ela estava paralítica por histeria de conversão, quando, na verdade, era devido ao pau-de-arara e aos choques elétricos.

Ele vinha com um esparadrapo cobrindo a identificação, mas por acaso, eu consegui ver seu nome. Um dia, ele esqueceu na cela um receituário de uma amiga - a Dulce, que estava presa comigo na época e estava quase paralítica de tanto eletrochoque. Quando ele esqueceu esse receituário para a Dulce, eu vi o nome dele: Amílcar Lobo Moreira da Silva. Nunca mais esqueci. Quando eu saí de lá, eu o denunciei no exterior. Os psicanalistas do exterior receberam essa denúncia em 1972. Foi aí que se começou a falar e a Sociedade Psicanalítica impediu que ele continuasse fazendo sua formação. Muitos anos depois, quando houve a abertura, em 1986, conseguimos que o Conselho Regional de Medicina o cassasse.

.