Nota da Anistia Internacional afirma que Freixo foi convidado para dar palestras na Europa, não fala em 'exílio' e elogia proteção do governo do Rio ao Deputado

Nota assinada pela Anistia Internacional e pela Front Line Defenders (uma Fundação Internacional criada para proteger os defensores dos Direitos Humanos no mundo) informa que o Deputado Marcelo Freixo (PSOL-RJ) foi convidado "para viajar à Europa a fim de falar sobre a expansão das milícias, faz parte de uma campanha internacional que já dura alguns anos".

"Com tal propósito, a Front Line Defenders e a Anistia Internacional convidaram Marcelo Freixo a visitar a Europa em apoio a sua campanha, para encontrar-se com autoridades e ativistas de direitos humanos a fim de captar apoios que fortaleçam essa ação internacional."

Ao final, reconhecem o esforço do governo do Rio de Janeiro na proteção ao Deputado e pedem medidas mais efetivas contra as milícias:

"A Front Line Defenders e a Anistia Internacional reconhecem que as autoridades estaduais têm continuamente fornecido proteção armada ao Deputado, e que tal proteção está sendo atualmente reforçada. Entretanto, está na hora de as autoridades federais, estaduais e municipais implementarem as recomendações pendentes da CPI das Milícias, a fim de garantir que todos os cidadãos do Rio de Janeiro possam viver com mais paz e segurança."

O original do documento em inglês e sua versão para o português (em pdf) encontram-se no site da Front Line Defenders.

Pela nota fica claro que a notícia de que o Deputado teria aceitado abrigo da Anistia Internacional para um exílio no exterior é, como diria Mark Twain, "um tanto exagerada".

Infelizmente. Porque se por um lado o governo oferece proteção a Freixo (o que é reconhecido na nota e até pelo Deputado), por outro faz vista grossa com os milicianos, como provam as recentes fugas de dois deles - um acusado de ser o homem que teria recebido a encomenda de assassinar Marcelo Freixo por R$ 400 mil.

O governador do Rio Sérgio Cabral tem notórias relações com milicianos, como prova este vídeo em que o governador confraterniza com dois deles.



Há quem veja em toda essa história de "exílio" uma forma de Freixo se cacifar para a eleição do ano que vem como o principal opositor a Eduardo Paes na disputa à prefeitura do Rio. Pode ser. Afinal, político não gosta de espaço vazio. E Freixo é político.

Mas existe também na atitude de Freixo uma forma de aumentar o preço de sua morte, torná-lo um defunto muito caro. Só que as milícias são ricas. E Freixo sabe disso. Tanto que em uma entrevista ao JB disse que uma das milícias investigadas faturava R$ 170 mil por dia, apenas com a exploração das cooperativas de vans.

A esses dois motivos junta-se um terceiro, que é o declarado pelo Deputado: sua denúncia contra as milícias e a pouca atenção (às vezes cumplicidade) entre milícias e prefeitura e governo do estado, como afirmou na mesma entrevista ao JB:

Freixo: Há uma tolerância, ainda hoje, muito maior por parte do poder público com as milícias do que com outros grupos criminosos. Deveria ser igual. Vou te dar um exemplo: As UPPS (Unidades de Polícia Pacificadora), que representam um projeto interessante, não atingem as milícias. Elas são todas em área de tráfico de drogas.A não ser no Batan. Se você questionar alguém do governo, vai falar isso. Mas o Batan era uma área de milícia, mas tem um efeito simbólico. Foi lá que repórteres do Jornal O Dia foram barbaramente torturados. Então, o Batan é uma resposta simbólica.

Esse episódio pode ser considerado um divisor de águas?

Sim. Só aprovei a CPI por causa disso. A CPI esperou um ano e meio para ser aprovada. Para você ver como a milícia tem força no Parlamento. Então, são 58 propostas concretas que não envolvem só ação policial. Por exemplo: transporte alternativo. O Deco está preso, inclusive, porque controlava o transporte alternativo. Onde a milícia se estabelece, controla o transporte alternativo. É um lucro absurdo. Só para se ter uma ideia, uma das milícias em que conseguimos a quebra de sigilo, tivemos acesso as contas da cooperativa de vans. O faturamento era de R$ 170 mil por dia. Só com o transporte alternativo.Então, se a prefeitura do Rio de Janeiro não fizer alguma coisa, as milícias continuam agindo. Entreguei um relatório nas mãos do prefeito (Eduardo Paes/PMDB) e, até hoje, a prefeitura continua não regulamentando o transporte alternativo, fazendo a licitação por cooperativa, e não uma licitação individual, como a gente propôs.

O senhor está dizendo que há uma omissão do poder público?

É mais do que omissão. É conivência, porque a milícia acaba sendo interessante para alguns projetos políticos. Todo miliciano é base do governo. O Deco era base do Eduardo Paes. O Deco era do PR, mas votava tudo com o prefeito, porque tem favores da prefeitura no seu domínio e retribui à prefeitura com votos.Esse escândalo que envolve crime, polícia e eleição é o que mais alimenta a milícia. Precisa ser debatido largamente. Não é um problema policial. É um problema político.

O senhor destacou a infiltração de milicianos na política. Há, na sua opinião, partidos que favorecem esse processo?

Claro. Essa é uma radiografia muito interessante. Nenhum deles é eleito pelo partido da milícia. Na época do (ex-prefeito) César Maia (DEM), quase todos eram candidatos pelo Democratas ou pelo PMDB, que era o partido do governador.

A ameaça à vida do Deputado Marcelo Freixo é real. Milicianos e banda podre das polícias não costumam perdoar. Como provou recentemente o covarde assassinato da juíza Patrícia Accioly.

Portanto, faz bem o Deputado em por a boca no trombone, bater tambor no Brasil e no exterior, pra ver se o estado se move e ataca as milícias e a banda podre.

Como aponta a nota da Anistia Internacional e da Front Line Defenders, só uma ação conjunta de município, estado e governo federal pode fazer frente ao poder das milícias. Estado e município estão devagar, quase parados.

Talvez o fato político gerado pelo "exílio" de Marcelo Freixo deflagre a ação que junte as três instâncias para combater efetivamente as milícias, que já se espalham pelo Brasil. Antes que seja tarde.