Quem tem receio dos debates, não sabe que chegou a hora da onça beber água e desconhece a sede da onça




Vejo algumas pessoas inseguras quanto à participação da presidenta nos debates contra Aécio.

Cheguei a receber manifesto para que ela se recusasse a comparecer aos que virão, a começar pelo de hoje na Band - aquela rede cujo presidente criminosamente ameaçou Haddad, impunemente.

Discordo, porque é incontrolável o ruído comunicacional que isso poderia gerar, já que temos toda a mídia corporativa contra o governo.

Mas discordo principalmente porque confio em Dilma. E não confio em Aécio.

Eu me lembrei de um caso, nos primórdios da retomada das maratonas, na década de 1970. Havia um estadunidense que ganhava várias delas. Acho que se chamava Bill Rogers - não tenho certeza, mas o nome não é importante para o que eu quero contar. Esse Bill (que seja Bill, pronto) ganhava muito, mas seu tempo sempre estava distante do recorde mundial.

Até que um jornalista perguntou ao recordista da época, um havaiano, se não me falha a memória (que vive falhando), por que ele achava que aquilo acontecia. 

Ele disse que Bill (cansei e fui ao google: o nome é Bill Rodgers) era um homem de classe média, e para bater o recorde mundial, correr abaixo de 2h20 (naquela época, hoje, mais dia menos dia, vão baixar de 2h), mas, dizia o recordista, que quem corria abaixo das 2h20 urinava sangue, sentia dores horríveis pelo corpo. E Rodgers, filho de classe média, não estava pronto para isso.

O mesmo penso do debate entre Dilma e Aécio. Ou melhor, dos debates. Aécio sempre foi um playboy, curtindo a juventude sem preocupações da zona sul do Rio, com um Bolsa Salário na Câmara dos 17 aos 21 para pegar surf e namorar. Depois um empreguinho de diretor da Caixa, sem nunca ter trabalhado num banco. Empreguinho garantido pelo primo e ministro da Fazenda na época, Francisco Dornelles, que havia sido indicado pelo avô de Aécio, Tancredo. Nepotismo puro.

Dilma, ao contrário, enquanto Aécio curtia a vida (veja bem, se não fosse pelo Bolsa Salário da Câmara, nada contra ele curtir a vida), pegou em armas contra a ditadura militar. E essa opção, na época, significava estar preparada para matar ou morrer.

Foi presa e barbaramente torturada por três anos, sem delatar seus companheiros. Essa mulher tem a lembrança da dor, do estoicismo necessário para suportar o que for para alcançar um objetivo.

Dilma sabe o que pode acontecer caso Aécio venha a se eleger. E ela sabe que cabe em boa parte a ela impedir que isso aconteça.

Ambos querem vencer, é óbvio. Mas a derrota para Aécio significará apenas voltar ao Senado (quer dizer, ao Leblon de onde ele senadeia).

Para Dilma, não. Porque essa luta não é de agora. Começou quando ela pegou em armas aos 17 anos. E, se não foram os milicos que a impediram de lutar, lutar, até chegar à Presidência da República para poder realizar os sonhos de toda uma geração, não vai ser quem sempre teve tudo de mão beijada, tutelado pela irmã, que irá dobrá-la.

Dilma é cintura dura. Não é simpática. Não tem o dom da oratória. Mas, na hora H, ela solta tudo o que na ditadura, na tortura, remoía dentro dela, e aí as palavras jorram.

Na hora da onça beber água, ela seca o rio, não é, senador Agripino?





OBS: Não dou links para a míHdia corporativa porque eles também não nos linkam quando nos citam.

Madame Flaubert, de Antonio Mello