O Globo contra Kamel: Reportagens de O Globo contestam artigo do diretor de jornalismo da Rede Globo

Na contramão do artigo de Kamel, publicado no dia anterior, O Globo de ontem publicou reportagens de mais de meia página, mostrando que o Bolsa Família não é um programa para matar a fome, como erroneamente afirma o diretor de jornalismo da Globo. Isso mostra que o Ratzinger da TV não está com essa bola toda no jornal das Organizações Globo. Uma contestação como essa não aconteceria na TV Globo.

Numa das reportagens, a secretária Nacional de Renda e Cidadania do MDS, Rosani Cunha, admitiu que beneficiados pelo programa utilizam-se dos recursos para comprar eletrodomésticos, o que não é proibido pelo programa, e que isso, ao invés de ser criticado (como o foi por Kamel), deveria ser elogiado.

— A família tem autonomia para usar o recurso do Bolsa Família como quiser. Pesquisas do ministério apontam que a maior parte do dinheiro é usado para comprar alimentação. Quem melhor sabe como alocar esses recursos, melhor aproveitá-los, é a própria família. É dinheiro seguro para o orçamento doméstico. Se está permitindo compra de eletrodomésticos, que bom. O país deveria aplaudir.

A secretária lembrou que “o programa existe também para eliminar a pobreza entre gerações e, por isso, exige o cumprimento de contrapartidas como a freqüência escolar”.

A outra reportagem eu reproduzo na íntegra, a seguir. É da repórter Letícia Lins. É para que você veja como está sendo feito esse uso abusivo do Bolsa Família.

Mulheres usam dinheiro para comprar TV, beliche e material de construção


AGRESTINA, PE. Aos 37 anos, a lavradora Mércia Josefa da Silva não sabe quantas colheitas de feijão e milho já perdeu devido às secas que assolam o Agreste de Pernambuco. Ela diz que a estabilidade financeira da família chegou com o Bolsa Família por causa dos dois filhos menores, Bruno Eric, de 12 anos, e Carolaine Evelyn, de 8: R$94 mensais. O dinheiro paga a cesta básica, o material escolar, e permitiu que economizasse uns trocados para comprar uma televisão em cores, depois de usar por três anos uma emprestada pela sogra.

— Sem a bolsa eu não conseguiria economizar, pois o dinheiro que tiro da roça só dava para a comida. Nem mesa eu tinha para comer. Depois do Bolsa Família, consegui comprar uma mesinha e a TV — conta ela, que mora na área rural de Agrestina, a 154 quilômetros da capital.

Ela diz que passou cinco anos juntando dinheiro, até que reuniu R$480 sob o colchão. Comprou a TV à vista. Agora pretende melhorar a casa de quatro cômodos, chão de cimento batido e com banheiro externo:

— Sonho em fazer o reboco e construir um murozinho.

Os outros eletrodomésticos que Mércia tem são anteriores à inscrição no programa social do governo: um aparelho de som, um liquidificador velho e uma “geladeira caindo de velha”, diz.

Salomé Maria Pereira da Silva, de 34 anos, três filhos, também conseguiu comprar bens com os R$112 mensais da bolsa. Ela trabalha no roçado, mas é o dinheiro do programa social que lhe garante a comida na mesa, a roupa das crianças e até a próxima sandália que vai comprar (a única que tem está quase se partindo). Ela conta que ainda sobrou para que ela comece a realizar o maior sonho: fazer um banheiro dentro de casa. O atual é um barraco, uma “loninha” no fundo do quintal. Ela já comprou cimento, cerâmica, tijolo e chuveiro. Vai continuar juntando para pagar o pedreiro.

— Sem o Bolsa Família, o dinheiro não dava nem para comer — diz Salomé, que tem todos os filhos na escola.

Maria José da Silva, de 32 anos, quatro filhos, recebe a bolsa há cinco anos. Recebe R$142 mensais, com os quais comprou um beliche para os filhos, que dormiam ou com ela em redes ou colchões pelo chão.

E você, o que acha? Kamel está certo ao criticar o uso de recursos do Bolsa Família para a compra de eletrodomésticos (e também uma mesa para comer, uma sandália, para substituir a que está se partindo, material de construção, para construir um banheiro em casa, beliche...)?

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