O que há por trás das invasões e ondas de protesto que aconteceram ontem pelo Brasil e que a mídia corporativa não diz

Rádios, jornais, TVs, desde ontem a mídia corporativa deita e rola com uma crítica virulenta ao que chamam genericamente de ocupações e atos violentos do MST, que aconteceram pelo Brasil.

Como o objetivo deste blog é buscar informação alternativa, fui direto à fonte, o site do MST, para ler a versão deles:

A Via Campesina e trabalhadores urbanos integrantes da Assembléia Popular realizam uma jornada de lutas para denunciar os problemas causados pela atuação das grandes empresas no país, especialmente as estrangeiras, que são beneficiadas pelo modelo do agronegócio e pela política econômica neoliberal, nesta terça-feira. A Assembléia Popular é um espaço de organização de comunidades e articulação dos movimentos populares da cidade.

Já aconteceram protestos em Pernambuco, Paraíba, São Paulo, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Santa Catarina, Alagoas, Paraná, Tocantins e Rondônia. O modelo econômico baseado no capital financeiro e no oligopólio de empresas transnacionais, principalmente do setor do agronegócio e da energia, sacrifica a renda da população com o aumento do preço dos alimentos e da conta de luz.

As ações denunciam que a especulação das empresas transnacionais e do capital financeiro, que impõem a monocultura de cana e eucalipto, causam a crise do preço dos alimentos. O mercado agrícola mundial é controlado pelo oligopólio de menos de 40 empresas que controlam toda produção, insumos, processamentos até a agroindústria.

No nordeste, organizações populares denunciam que a transposição do Rio São Francisco beneficiará apenas os latifundiários do agronegócio. O projeto do governo mostra que a destinação da água é de 4% para a população rural, 26% para o meio urbano e 70% para o agronegócio.

Em Rondônia, 300 trabalhadores do MAB e Via Campesina trancaram, nesta manhã [o texto sempre se refere ao dia 10 de junho], a BR 364, em Candeias do Jamari, a 20 Km de Porto Velho, no trecho que liga Porto Velho a Cuiabá. A rodovia é o principal caminho para o escoamento da soja produzida no Mato Grosso. A mobilização visa denunciar o desmatamento da Amazônia, a ocupação ilegal de enormes extensões de terra para plantação de soja e protesta contra a construção dos usinas do Complexo Madeira. Em Ouro Preto, 200 pessoas fizeram uma mobilização por redução no preço da energia.

Em Tocantins, atingidos pela usina hidrelétrica de Estreito trancam a estrada de ferro da Vale do Rio Doce, no município de Darcinópolis, em Tocantins. Cerca de 400 pessoas paralisam o tráfego do trem que abastece as obras da ferrovia que ligará o Porto de Itaqui, no Maranhão, ao município de Senador Canedo, em Goiás.

Depois de construída, a ferrovia fará o transporte da soja produzida na região amazônica e de minério de ferro da Vale. Além de denunciar o corte ilegal da floresta amazônica e do cerrado para grandes extensões de lavoura, os manifestantes reivindicam o cumprimento dos acordos feitos entre eles e a empresa Valec, construtora da ferrovia.

No Paraná, cerca de 300 agricultores do MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens) e da Via Campesina estão acampados na hidrelétrica de Salto Santiago, no Paraná, em protesto contra a transnacional franco-belga Suez-Tractebel, dona da barragem. É a segunda vez no ano que a UHE de Salto Santiago é ocupada por trabalhadores rurais. Eles também protestam contra lei que impede agricultores de viverem a menos de cem metros da mata ciliar no entorno do lago da barragem. Os manifestantes exigem uma rodada de negociações com o governo para resolver os problemas dos atingidos pela barragem.

Em Pernambuco, cerca de 200 trabalhadores rurais da Via Campesina ocuparam a Estação Experimental de Cana-de-Açúcar (EECAC), no município de Carpina, Zona da Mata Norte de Pernambuco, nesta manhã, em protesto contra o avanço da monocultura de cana-de-açúcar na região, que contribui para a elevação da crise dos alimentos no país. Durante a ocupação, os agricultores destruíram mudas de variedades de cana, inclusive espécies transgênicas, e cortaram cerca de dois dos 100 hectares de cana-de-açúcar plantadas na Estação.

A Estação Experimental é uma Parceria Público-Privada entre o Sindaçúcar (Sindicato da Indústria do Açúcar e do Álcool), que reúne as 20 maiores usinas estaduais, e a Universidade Federal Rural de Pernambuco. Com 250 hectares, a área poderia assentar cerca de 50 famílias Sem Terra e produzir alimentos para abastecer as feiras da região.

No Espírito Santo, cerca de 500 trabalhadores da Via Campesina realizam um protesto contra a expansão do monocultura da cana-de-açúcar. A mobilização está ocorrendo no município de Montanha, onde será instalada uma nova usina, pertencente à empresa estrangeira Infinity Bio-Energy, companhia criada em 2006 e sediada na Ilha das Bermudas, e que já comprou todas as usinas de cana do norte do ES.

A região norte do Espírito Santo conta com 40 mil hectares de cana plantados e deve ser dobrada a área de plantio nos próximos anos. Isso está sendo estimulado tanto pela instalação da empresa Infinity Bio-Energy, que pretende tornar-se líder mundial na produção e distribuição de álcool e outros biocombustíveis, e pelo governo do estado, que apontou a meta de ampliação em 133% da produção de álcool, conforme o Plano Estratégico de Agricultura Capixaba (PEDEAG).

Em São Paulo, 450 trabalhadores da Via Campesina ocuparam uma fazenda no município de Mirante do Paranapanema, da Organização Odebrecht, que está construindo a usina Conquista do Pontal para a produção de etanol. A Odebrecht, entre outras empresas, estão se utilizando irregularmente de terras públicas para a instalação de usinas e plantio de cana-de-açúcar.

O projeto de expansão da Odebrecht prevê a utilização de 160 mil hectares de terras para a produção de matéria-prima (cana-de-açúcar). Essas terras estão dentro do 11° perímetro do Pontal do Paranapanema, uma região de terras públicas.

Na cidade de São Paulo, cerca de 600 trabalhadores rurais da Via Campesina e integrantes da Assembléia Popular ocuparam prédio da Votorantim e CPFL para denunciar os impactos ambientais da construção da barragem de Tijuco Alto, no Rio Ribeira de Iguape, que corta os estados de São Paulo e Paraná. O protesto também denuncia os altos preços da energia elétrica.

A Polícia Militar invadiu o prédio com soldados e reprimiu com violência a manifestação pacífica, com bombas de gás de pimenta e tiros. Foram presos cinco manifestantes da Via Campesina e Assembléia Popular, liberados no final da tarde.

O Ibama reprovou duas vezes os Estudos de Impacto Ambiental (EIA/Rima) apresentados pela companhia. A empresa enviou um novo relatório em 2005 e ainda não recebeu parecer conclusivo do Ibama. Ainda existem duas pendências: uma referente ao dispositivo legal que permite a inundação de cavernas (há duas na área a ser alagada), e outra relativa à revalidação do direito de uso dos recursos hídricos do rio Ribeira, a cargo da Agência Nacional de Águas (ANA).

Na Paraíba, mais de 200 trabalhadores rurais da Via Campesina ocuparam o latifúndio Nossa Senhora de Lourdes, localizado a 5 km da cidade de Mari, que possui 1.100 hectares com a monocultura da cana. A propriedade de Carlos Ribeiro Coutinho foi arrendada para a Usina Jacungu.

Os lavradores estão recebendo ameaças de pistoleiros, que começam a rondar o acampamento, com homens armados vestidos de preto preparados agirem à noite contra os trabalhadores rurais acampados.

“Os integrantes da Via Campesina denunciam o modelo agroexportador, e a opção do governo por ele. Expandido a monocultura da cana de açúcar, cada vez menos terra sobra para ser feito a Reforma Agrária e para a produção de alimentos”, denuncia Dilei Aparecida, da coordenação estadual da Via Campesina.

No domingo, 150 famílias ocuparam um latifúndio nas Várzeas de Sousa e ainda permanecem acampadas no local para denunciar a opção do governo de expandir o agronegócio na região, beneficiando o Grupo Santana Sementes. Desde domingo, os fiscais da área estão fazendo varias ameaças às famílias acampadas, mas elas permaneceram resistindo no local.

No Ceará, cerca de mil trabalhadores rurais da ocuparam o Porto do Pecém, situado em São Gonçalo do Amarante (região metropolitana). Foram fechadas as áreas de carga e descarga do terminal em protesto contra o projeto de instalação de cinco termoelétricas, uma refinaria e uma siderúrgica no complexo, que vão causar danos ambientais e sociais.

Além disso, os trabalhadores protestam contra a alta dos preços dos alimentos, transposição do Rio São Francisco e instalação de uma refinaria da Petrobrás, que será construída em cima da bacia hidrográfica e o consumo de água será equivalente a uma cidade de 30 mil habitantes.

Na Bahia, agricultores da Via Campesina ocuparam a barragem da usina de Sobradinho para denunciar que os grandes projetos de irrigação beneficiam apenas os latifundiários do agronegócio, especialmente o projeto de transposição do Rio São Francisco, o Pontal Sul, em Petrolina, e o Projeto Salitre, na cidade vizinha de Juazeiro, na Bahia.

Depois de investimento publico em infra-estrutura de irrigação (no caso do Pontal Sul já foram investidos cerca de 250 milhões de reais), essa estrutura é privatizada nos acordos de Parceria Publica Privada (PPP).

Em Alagoas, 1.000 pessoas de diversas organizações populares, Via Campesina, grupos, pastorais, povos e comunidades tradicionais (Indígenas, Quilombolas e Pescadores Artesanais) fazem protesto na hidrelétrica de Xingó contra a transposição do Rio São Francisco, construção das novas barragens e a baixa vazão do rio, que causa fortes impactos na Foz do Rio São Francisco. Os manifestantes denunciam que a transposição e as novas barragens beneficiam apenas os latifundiários do agronegócio.

No Rio Grande do Sul, trabalhadores do campo e da cidade ocuparam cedo da manhã desta terça-feira a transnacional de alimentos Bunge, na cidade de Passo Fundo (região Norte gaúcha). Os camponeses e trabalhadores denunciam o monopólio que as empresas de alimentos, como a Bunge, implementam no mercado, definindo os preços pagos pelo trabalhador nos supermercados, que estão cada vez mais caros.

O Ministério da Agricultura concluiu em estudo que a Bunge, no Brasil desde 1938, montou um oligopólio no setor brasileiro de fertilizantes e vem sendo responsável pela alta do preço dos alimentos, com os altos custos de produção de lavouras. Além disso, a Bunge precisou ser intimada pela Justiça em 2007 para rotular como produto que contém transgênico o seu azeite Soya, pois escondia essa informação da população.

Na divisa dos estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, cerca de 300 trabalhadores rurais ocuparam as instalações da Usina Hidrelétrica de Itá, que pertence à transnacional franco-belga Suez-Tractebel e a ação faz parte da jornada nacional de lutas da Via Campesina contra o modelo energético e econômico e contra as transnacionais.

A Suez-Tractebel é a maior empresa estrangeira de geração de energia no Brasil, com 13 usinas (6 hidrelétricas e 7 termelétricas). Segundo dados da própria empresa, em 2007, o lucro líquido foi de R$ 1,05 bilhão, 6,8% acima do lucro obtido em 2006.

Em Santa Catarina, foram realizadas mobilizações em duas regiões do Estado. Cerca de 700 trabalhadores estão em frente à Klabin, empresa de papel e celulose, que detém 160 mil hectares de pinho e eucalipto no estado.

Além disso, os manifestantes distribuem 500 mudas de árvores nativas e 15 toneladas em cestas de alimentos para a população da cidade de Otacílio Costa, que inclui morangas produzidas em um assentamento da Reforma Agrária no município de Ponte Alta. Os manifestantes também irão plantar centenas de mudas de árvores nativas, em protesto contra o "deserto verde", provocado pelo plantio em grande escala de pinus e eucalipto.

No município de Maravilha, 1200 trabalhadores da Via Campesina estão concentrados no trevo da BR 282 e trancaram a rodovia, que dá acesso à cidade, onde farão protestos contra a Aurora, que representa o modelo de produção do agronegócio.

Em Minas Gerais, 500 pessoas participantes da Assembléia Popular bloquearam a linha férrea da mineradora Vale, na altura do bairro São Geraldo, em Belo Horizonte, para denunciar os problemas causados pela passagem do trem. O trem bloqueia a passagem de veículos por até 2 horas e, desde o ano passado, já morreram 04 pessoas dentro de ambulâncias, inviabiliza as aulas da Escola Municipal Pe. Francisco Carvalho Moreira por causa do barulho e abala a estrutura das casas.

Os integrantes da Assembléia Popular de Belo Horizonte, nos bairros de São Geraldo, Caetano Furkim, Boa Vista, Casa Branca e Vila Mariana de Abreu pedem a transposição da linha há 25 anos e a indenização das famílias que perderam parentes. Em 2007, paralisaram a passagem do trem por duas ocasiões e nenhuma das promessas foram cumpridas.

Uma comissão apresentou como pauta a exigência da transposição dos trilhos. Os representantes da FCA e da Vale garantiram o início das obras no prazo de 40 dias. O mesmo acordo foi firmado também com a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres).

Como se vê, uma infinidade de reivindicações, mas a mídia corporativa não nos informa sobre nenhuma delas. Apenas nos diz que as ações são violentas, sem nenhuma explicação sobre o que as teria motivado.

Ou, nas palavras de Brecht:

"Do rio que tudo arrasta se diz que é violento Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem"

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