A quem favorece o silêncio do Blog do Mino?

Mino Carta está fazendo falta. É verdade que ele ainda escreve na sua Carta Capital. Mas é diferente. O dia-a-dia da blogosfera, o “calor dos acontecimentos”, tudo isso sente falta da palavra de Mino. Ainda que seja para discordar dele às vezes.

Mino Carta está para a imprensa brasileira como Fernando Barbosa Lima, recentemente falecido, está para a história do jornalismo televisivo. Embora Mino seja muito mais temido (pelos ex-patrões e sua turma) e tenha sua importância muito mais reconhecida que a de Fernando Barbosa Lima.

Mas até o mundo mineral sabe da importância das palavras de Mino em seu blog. Especialmente porque ele conhece os intestinos da nossa mídia porcorativa e – mais importante – eles sabem que ele sabe.

Portanto, a pergunta do título só pode ter uma resposta: o silêncio do Mino em seu blog favorece a mídia porcorativa e suas reporcagens.

Por isso, Mino deveria rever sua atitude e voltar ao blog, ao cotidiano dessa batalha por uma comunicação mais democrática, que travamos em nossos modestos blogs contra os barões da mídia.

Porque, cá entre nós, o tal jornalismo como o conhecíamos, aquele defendido pelos sindicatos com seus diplomas, já era. A informação hoje é – para usar uma expressão do mercado que nos governa – commodity. Está aí à disposição de todo mundo. O que faz cada vez mais a diferença é o agente que transmite a informação, porcalista ou não, desde que ele tenha para o leitor / ouvinte / telespectador credibilidade. Isso Mino Carta tem de sobra.

Mino faz falta até nos comentários sobre futebol. Embora ele não entenda nada do assunto, pois defende que é futebol aquilo praticado pelos cinturas-duras de sua Itália – e que vagamente lembra o esporte inventado pelos ingleses mas criado e aperfeiçoado no Brasil. Até falando besteira ele o faz com estilo. Talvez pela qualidade dos botões com que dialoga.

Mas, enquanto Mino não volta, leia o que ele escreveu na sua Carta Capital desta semana, originalmente aqui:

Antes e depois da Satiagraha

Que plano republicano é este em um país que se diz República? Até parece que as maiores ameaças rondam o Brasil, republicano há 120 anos, e sua atual Constituição, velha de 21. O simples anúncio de que os representantes dos Três Poderes democráticos se reuniram para assinar o tal imponente e caudaloso documento presta-se a despertar, muito além de perplexidades, espanto e temores. Ou não, melhor cair na gargalhada?

Fosse este, ao contrário do que entendia De Gaulle, um país sério, teríamos fartas razões para recear uma ruptura institucional, a impor a urgência de um acordo por cima. Sim, convenhamos: a nação não parece incomodar-se com a solene encenação. Mas, assim como cabe a pergunta “que República é esta?”, também vale outra: que nação é esta?

Interpretação viável. O presidente do STF, Gilmar Mendes, denuncia há tempo a ameaça de um “Estado policial” pronto a se instalar no País, se já não teria tomado posse. Não falta quem, do lado oposto, aponte a tentativa do ministro Mendes de submeter o Brasil a um “Estado judicial”. Estaria aí o confronto em andamento?

Pode ser. Mas não se desenrola também uma luta surda, porém acirrada, dentro da própria PF? Remonto, talvez instintivamente, à Operação Satiagraha como a um divisor de águas, momento fatal que separa o antes do depois. A partir daí o circo arrisca-se ao incêndio, a despeito da tentativa bombeira da mídia. Com os habeas corpus a Daniel Dantas, Mendes ganha dimensão extraordinária, reforçada pela história fantasiosa do pretenso grampo da sua inócua conversa com o senador Demóstenes, o que o leva a “chamar às falas” o presidente da República. E o presidente? Acede ao chamado.

Decorrem implacavelmente o desterro do diretor da Abin, Paulo Lacerda, e as diversas vicissitudes sofridas pelo delegado Protógenes e pelo juiz Fausto De Sanctis. Recordo que na manhã do dia em que foi deflagrada a Satiagraha, figura importantíssima do governo (escolho o superlativo, embora avise não se tratar do presidente Lula) ligou-me para dizer: “Viu, viu o que a gente fez?”

Caí das nuvens, nada sabia. Ouvi todas as explicações do outro lado da linha, a começar pela frase: “Prendemos o orelhudo”. A figura, sublinho importantíssima, estava eufórica. Com o decorrer dos dias e dos meses mudou o tom. Quem sabe a manada tenha entrado na linha. Encontro motivos, contudo, para acreditar no delegado Protógenes quando afirma que a Satiagraha recebeu o aval do Palácio do Planalto.

Seria o destino do banqueiro do Opportunity tão decisivo para a saúde da República? Haja surpresa. De todo modo, enxergo no pacto republicano o enésimo arreglo para oferecer aos privilegiados do Brasil ulteriores e mais amplos privilégios. Acerto a bem da patota, da turma, do grupo. Do estamento, diria Raymundo Faoro, de vivíssima memória nesta redação. Algo bem mais medíocre do que a célebre conciliação das elites, mas de efeitos igualmente deletérios para a maioria dos cidadãos, sufragado pelo apoio, diria mesmo a proteção, da mídia.

Sim, que República é esta, que nação, que elites... E qual seria o país sério, democrático e civilizado em que a mídia não repercute uma grave acusação contra o chefão da polícia, suspeito de atentado aos direitos humanos?

CartaCapital, com uma reportagem de Leandro Fortes, acusou o diretor da PF, Luiz Fernando Corrêa, de ter torturado a empregada doméstica da avó da mulher nas dependências da polícia de Porto Alegre, quando lá prestava serviço. Corrêa não soube produzir explicações convincentes para o fato, e muito menos o desmentiu categoricamente. Contou, entretanto, com o costumeiro silêncio do jornalismo pátrio. Normal, normalíssimo. Estamos é no Brasil.

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