É a pergunta que me faço, quando ouço e leio que a cruel situação vivida por três repórteres do jornal carioca O Dia está sendo vendida como um atentado à liberdade de imprensa.
Essa é uma visão equivocada, que tira o foco da verdadeira questão: como uma empresa jornalística deixa três de seus funcionários arriscarem suas vidas para produzir uma reportagem que tinha tudo para dar errado, e deu?
Se já é difícil uma matéria dessas num morro dominado pelos traficantes, onde você pode (pelo menos em tese – eu disse “em tese”) contar com o socorro da polícia, é um risco enorme colocar três repórteres incógnitos numa favela comandada pelas milícias, onde os bandidos são policiais. Nessas horas, nem rezando para Julinho da Adelaide para chamar o ladrão.
Descobertos, os repórteres foram barbaramente torturados, por mais de sete horas, e só não morreram sei lá por quê. Ou sei: a certeza da impunidade, o que ficaria mais difícil, caso eles fossem mortos, pois isso aumentaria a mobilização da sociedade.
Sei é que isso está sendo bastante explorado pelo jornal, tanto em sua versão de papel, como na online.
Vale o risco? Vale arriscar a vida de três repórteres? Por pouco, o caso não explodia na mesma data da morte de outro jornalista investigativo, Tim Lopes. Até hoje, passados seis anos, uma história ainda não de todo contada.
O jornalista Mário Augusto Jakobskind escreveu um livro sobre o tema, e numa entrevista levantou aspectos pouco aprofundados na época, como qual teria sido a responsabilidade do jornalismo da Globo no caso. Afinal, Tim Lopes havia recebido o Prêmio Esso, ficara conhecido – o que deveria ser um impeditivo para quem quer fazer matérias investigativas, na condição de anônimo infiltrado. Tim Lopes foi o primeiro ganhador deste prêmio na categoria de telejornalismo. Ao receber o prêmio, em dezembro de Na entrevista, Jakobskind denuncia até o comportamento do Sindicato dos Jornalistas: O caso Tim Lopes é um exemplo concreto de como funciona o esquema do pensamento único. Ou seja, através de um fato você apresenta ao leitor ou telespectador a "única verdade", simplesmente ignorando outros eventuais questionamentos que colocam em dúvida a versão oficial. Tendo como carro-chefe a Rede Globo, a opinião pública só foi informada sobre o assassinato de Tim Lopes no que interessava à emissora. Diretores da "Vênus Platinada" saíram em campo de uma forma avassaladora, vendendo a "verdade". Até mesmo na área sindical dos jornalistas, esses mesmos diretores, que antes da tragédia nunca chegaram a passar por perto da sede do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro, que dirá entrar, participavam ativamente das mobilizações relativas ao episódio e de assembléias. A direção sindical, ao invés de se posicionar de forma isenta, aceitando pelo menos examinar as colocações que questionavam o procedimento da TV Globo, simplesmente fechou questão em torno da versão da emissora. Ficou parecendo que houve uma espécie de permuta, ou seja, transmitir a verdade da Globo em troca de cinco minutos de fama... Nunca o Sindicato dos Jornalistas do Rio de Janeiro apareceu tanto na tela da Globo como a partir daquele episódio. [leia entrevista completa aqui] E você, o que acha? Liberdade de imprensa ou liberdade das empresas jornalísticas, que se aproveitam do período difícil que atravessa o mercado de trabalho dos jornalistas (quando muitos são obrigados a engolir não apenas sapos mas até camelo...), para explorar ao máximo o trabalho de seus contratados? » Hipocrisia de O Globo é desmascarada pelo próprio jornal » Miriam Leitão contesta Ali Kamel no Globo » O dia em que Kamel preferiu não testar hipóteses » Mino Carta detona Folha, Estadão, O Globo, JB, Civita e Frias » Demitido, repórter da TV Globo acusa emissora e Ali Kamel de manipularem cobertura política Clique aqui para ler as notícias de hoje do Blog do Mello Clique aqui e receba gratuitamente o Blog do Mello em seu e-mailLeia também: